5 de outubro de 2010

Diário de Campanha: O Novo Senhor da Guerra - 9ª Sessão Pt II

Segredos na Mina dos Forjados

Nada é capaz de cheirar de forma tão nojenta quanto o esgoto. O fosso, onde são depositados todos os dejetos de uma sociedade inteira é, muitas vezes, formado por uma infinidade de corredores e alas úmidas e de pouca luz, capazes de guardarem os mais intrigantes segredos em baixo da terra. O cheiro fétido do esgoto é um bom guarda-costas de seus itens mais preciosos que por ventura você gostaria de guardar no subsolo. Como eu sei disso? Bom, digamos que eu vivi tempo suficiente em Pinus para saber como funciona o sistema de saneamento daquelas terras. E quer saber? Os esgotos de Toran são tão nojentos quanto os da Ilha Pinheiro!
Estávamos nas minas dos forjados, certo? Droga... acho que perdi meu último relato em algum corredor sujo e imundo deste lugar. Não, sério, comparando-me a esta montanha, eu sou um nobre lorde limpo e bem cheiroso. Bom, mas o importante é que estávamos lá: Áries, o bruxo; Kreev, o draconato; Bleiner (meio quieto, mas estava lá) o monge; EU! O artífice da mente! E, é claro, Castiel... e seu decote... ah, sim... o decote...
...

...

...

Onde estávamos? Certo, na mina dos forjados. Após a exaustiva luta contra um grupo de seis (talvez sete, eu não me lembro ao certo) seres biônicos imbuídos a aço, a valente Comitiva Escarlate procurava seu caminho pelos corredores da mina.

- Huff, huff... Essas criaturas são mais fortes do que pensei! – Disse Kreev, esbaforido. – Rápido, temos que fechar esta porta antes que mais algum forjado venha para cá! Áries, você pode fazer isso?!

O bruxo, meio surpreso, correu cambaleante até o portal na tentativa de fechá-lo. Neste exato momento, ouvi um forte agudo sibilar em meus ouvidos.
- Argh! Que som é esse?! – Disse tapando as orelhas. Bleiner e Castiel também ouviam.
- Essa não! Por Jhakar! São mais forjados! Rápido Áries! Feche essa maldita porta!
- Não estou conseguindo! Parece encantada... – Áries balbuciava.
- O barulho está aumentando! – Disparou Bleiner, concentrando-se nas fortes batidas que acompanhavam o zunido.
- Parecem... ferro... ferro estalando no chão. – Completei, já sabendo que o restante do grupo entendera.
- Pelos deuses! Os forjados lotarão essa sala em poucos minutos! Temos que sair daqui!! – Gritou Castiel puxando Kreev pelo braço.
- Áries! A maldita porta!!
- Não estou conseguindo!!

“Plam! Plam, zuuuuun, blam!!” 

- Rapaziada, eu não sei de vocês, mas eu estou me mandando agora mesmo! – Disse ajeitando minhas coisas.
- Eu... eu vou com você! – Acompanhou-me Castiel
- Kreev, talvez isso seja o mais certo a fazer!
Forjado Bélico

Olhei para trás e vi Kreev já sendo acompanhado por cinco pares de olhares azuis, que brilhavam ao fundo. Rapidamente, o draconato pôs-se a correr indo de encontro conosco. Seguimos a passos rápidos iluminados por duas tochas carregadas descuidadamente pelo bruxo e Kreev. Ninguém quis saber o que estava atrás de nós, até porque, seria impossível enxergar algo naquela escuridão.
O corredor levou-nos a uma sala. Uma sala comum, como qualquer outra. Provavelmente, passaríamos despercebidos por ela e procuraríamos outro caminho. Entretanto, nós éramos perseguidos por criaturas poderosas e treinadas para nos matar e a sala... bem, a sala estava iluminada. Por instinto, adentramos o aposento sem portas, temendo os forjados.
A câmara era iluminada por três tochas, duas nas paredes e uma no final da sala.

- Huff, huff... Não façam nada que poderão se arrepender depois. – Disse Kreev colocando as mãos nos joelhos, curvando-se de forma arqueada.
- Não... não ouço mais os forjados...
- Nem eu... Hey! Ébrio! Não mecha aí!

Tarde demais para o aviso de Áries. Sem conseguir me controlar, fui até o fundo da sala e acabei puxando uma das tochas...

Ah, cara... eu só queria ajudar! Quero dizer, carregávamos apenas duas tochas em um caminho tão escuro quanto a garganta de um beholder! Infelizmente, não deu muito certo...
A última coisa que ouvi foi “Ébriooooooo!!!” num urro alto de Bleiner e então, a parede onde eu estava virou bruscamente e acabei saindo em uma sala secreta, projetada do outro lado da câmara onde estava a Comitiva. Também ouvi alguns xingos em dracônico que não sei se haveriam tradução para o Idioma Comum, mas isso não vem ao caso. Oh, sim! Eu falo dracônico, você sabia disso? Pois é... não sou pouca porcaria assim...

Mal pude ver as paredes da sala secreta e novamente o botão funcionou. Voltei à câmara. Bleiner parecia feliz. Áries sorriu-me com desdém.

- Puxa, vocês não vou acreditar! Há uma sala do outro lado dessa parede e...
- Ébrio, chega de gracinhas. Da próxima, vou deixar você do outro lado. – Kreev parecia querer manter a calma.
- Bom, mas... mass.. – Eu tentava dizer algo, tirando o cabelo dos olhos. Detesto isso. Dá a intenção de que não tenho assunto ou fugindo de algum, mas toda a vez que preciso explicar algo, meu maldito cabelo sempre rebate no meu rosto cobrindo dos olhos até o queixo.
- Rápido, vamos sair daqui. – Moveu-se Áries. – E encontrar alguma sala sem armadilhas.

Infelizmente, isso também não aconteceu...

De volta ao corredor, o caminho iluminado pelo par de tochas nos mostrou detalhes e fissuras nas paredes que me fez perceber o quanto os forjados zelam por seu “abrigo”. Haviam desenhos de liturgias, celebrações a um grande deus; gravuras em alto relevo, parecendo terem sido esculpidas há anos com muita atenção, revelavam a epifania daqueles seres. De repente, buscar um maldito castiçal começava a não fazer sentido algum para mim...
Uma nova sala surgiu à nossa direita. E, sim, era uma nova sala iluminada por tochas presas nas paredes. Você sabe o que isso significa, meu caro leitor? Exatamente! Novas paredes com passagens secretas! Se você estiver lendo esse conto em Pinus, vá buscar seu prêmio na Estalagem do Homem de Três Braços! Diga que foi “Ébrio” quem o mandou...

Enfim, adentramos a sala com cuidado, desta vez. Eu já havia aprendido a lição com passagens secretas, queria distância daquelas paredes. Mesmo assim, Kreev quis saber o que estava escondido atrás de uma delas e tenho certeza que o que ele viu não foi um barril cheio de Andermaltein gelando a menos 2 graus na neve de Anoehin.
O draconato puxou a pira de seu suporte. Rapidamente, um pequeno pedaço de chão, onde ele estava em cima, girou com a parede. Ele estava do outro lado da câmara e nós, estávamos preocupados.
Após alguns minutos, Bleiner ouviu o chiado do machado de Kreev. Parecia estar raspando-o na parede. “Temos que traze-lo de volta!” – Indagou Castiel, olhando para Áries. O bruxo, por sua vez, olha para cima, fitando o teto. Todos nós fizemos o mesmo e ficou claro, até mesmo para o mais ignorante dos seres que havia uma armadilha naquela sala.

- Se mais alguém puxar uma tocha, na tentativa de trazer Kreev de volta, tenha a certeza de que essas pedras irão cair. – Disse Áries com a cabeça erguida.
- ... Eu tenho uma idéia... – Disse olhando para as pedras.
- Por todos os deuses, diga-me que é algo bom... – O bruxo virou-se para mim.
- Hei, relaxa... já fiz isso um milhão de vezes... vou trazê-lo de volta. – Respondi dando uns tapinhas no ombro de Áries.
- Ébrio, meu amigo... só cuidado por que essas tochas... parecem estar queimando algo. - Bleiner tinha razão. A chama das tochas, presas nas paredes, conseguiam alcançar as cordas de suspensão da armadilha no teto da câmara. Se eu demorasse de mais, o fogo queimaria a trava do dispositivo, fazendo as pedras descerem de qualquer jeito.
- Certo, então vamos todos para o corredor. – Disse empurrando Bleiner e Castiel. Tarde de mais. Ouvi um “creck!” e uma das cordas se rompeu soltando fagulhas pela sala. As pedras se mexeram no alto do aposento. Antes que eu pudesse berrar “Corre cambada!” a outra corda de proteção partiu-se ao meio. As pedras começaram a descer. O fogo já havia se alastrado não só pelas cordas laterais, mas também pela rede que suspendia as rochas. Tive que improvisar.

Empurrei Castiel para o corredor – da qual Bleiner certificou-se de segura-la com todo o cuidado – e olhei para cima. “Fica frio aí!!” – Berrei apontando para as pedras incandescentes que quase alcançavam meu rosto. Estavam agora congeladas e presas por uma fina camada de gelo que não demorariam por muito tempo. Voltei rapidamente para o corredor onde os outros três olhavam-me com expressões assustadas e “puxei” uma das tochas presas em uma das paredes (quando eu digo “puxei” quero dizer que a levantei por meio de minha mente, sabe como é, né?). Kreev voltou à nossa câmara. Acenei para que viesse correndo. Mal o lagarto chegou ao corredor, o gelo se dissolveu e as pedras desceram a toda velocidade até o chão do aposento, estava coberto por rochedos. Felizmente estávamos todos bem. Felizmente?

- Kreev o que havia lá?! – Perguntou Castiel analisando suas feridas.
- Uma aranha... mas não uma aranha qualquer... – O draconato parecia fulo. Encostou-se no corredor enquanto a barda preparava torniquetes.
- Você não parece muito bem...
- É claro! – Ele bufou para Áries – Eu fui praticamente açoitado por uma maldita aranha com lâminas no lugar dos pés! O que esperava?!

Castiel levou as mãos à boca, em espanto. Áries parecia interessado nas aranhas. Bleiner não gostava de ver a barda dando atenção a um draconato e eu? EU SÓ QUERIA UM POUCO DE RECONHECIMENTO POR TRAZER KREEV DE VOLTA E QUASE MORRER PARA ISSO!! Sério! Nem um “Puxa Ébrio... você se arriscou um bocado ali” ou “Valeu, cara... Tenho certeza que isso paga as dividas que você me deve” nem mesmo um “Você é o melhor, Ébrio! Deveria ganhar todo o reconhecimento pelo seu trabalho!!” eu ouvi... Apenas um papo nojento sobre aranhas e garras venenosas...

De volta ao escuro corredor, o tiefling Áries seguia na frente com a única tocha que havia sobrado. Kreev perdera a sua no combate com a aranha. Eu olhava para Bleiner e ele ainda parecia zangado com os serviços prestados pela barda no draconato. Tentei reanima-lo dizendo que ele estava indo bem com a garota e que cedo ou tarde ela se renderia a seus “encantos”... Tá, ele não é um cara muito bonito, mas tem um bom coração! E aposto que é mais puro que você, seu maldito pecador! 
Quem é o selvagem agora?! 

Quem?!

Bom, mas estou divagando... novamente...

Caminhávamos ainda prestando atenção em algum barulho “metálico” que poderia sibilar do caminho de onde viemos. Áries parecia um sabujo empunhando a única tocha do grupo, porém, não ouvíamos nada a não ser a nós mesmos. De repente, um “clique” fez nossos ouvidos ficarem novamente antenados, mas de nada poderíamos fazer: à nossa frente, Áries começou a girar no lugar e em poucos segundos, o bloco de chão onde ele estava moveu-se levando-o para outro caminho, entre as paredes. Malditas passagens secretas...
Estávamos com o corredor transitável novamente... mas sem uma misera tocha ou algo que produzisse luz para iluminar o caminho!!

Assim seguiamos, os quatro. Sem saber onde o bruxo estava e muito menos sem saber onde nós mesmos estávamos.
A aflição começou a bater a porta. Pude ouvir Bleiner balbuciar, parecia nervoso. Kreev estava agitado e eu tenho certeza que retirei meus cabelos dos olhos umas quinze vezes seguidas. Parecíamos quatro cegos andando num corredor apertado. Um colado no outro. O draconato ia na frente, seguido de Castiel e Bleiner que seguravam-se em seus ombros, enquanto eu agarrava os ombros do monge. Preferi agarrar os ombros de um meio-orc aos de uma linda meio-elfa. Sim, a bebida está me fazendo falta...
Íamos nesse ritmo bizarro até pouco metros à frente, quando Kreev incrivelmente conseguiu achar um buraco no chão.

- Parem! Não dêem mais um passo! Há um buraco aqui. – Ele gritou. Tenho certeza que levantava as mãos, mas não consegui enxergar nem mesmo Bleiner na minha frente.
- E o que vamos fazer agora? – Perguntou Castiel.
- Não sei onde esse buraco pode levar, acho melhor contorna-lo.
- É, pelo cheiro... parece não vir coisa boa daí de dentro.

Nesse momento, pude ouvir passos pesados acompanhados de fortes batidas de ferro... Você sabe o que significa? Isso mesmo, forjados bélicos! Caso não foi retirar seu prêmio com o Homem de Três Braços, assegure-se de lhe informar que foi “Ébrio” quem o mandou...

- Essa não! Os forjados! – Guinchou Bleiner.
- Estão vindo atrás de nós! – Gritei ouvindo os sons que se aproximavam
- Espere... eles vêm pela frente! – Intrometeu-se Castiel.
- Não, o barulho vem de trás de mim.
- Não senhor. Ouço batidas estaladas se aproximando do meu lado!
- Como assim, mulher?! Eles estão atrás de nós, já devem ter nos achado!
- Ébrio... eu ouço escudos batendo no chão à minha frente!
- ELES VÊEM DE AMBOS OS LUGARES!! – Gritou Bleiner. O barulho começando a entrar em nossas cabeças.
- Não teremos escolha! Entrem na droga do buraco! – Kreev berrou, jogando-se para dentro da saliência no chão. Ele levou Bleiner e Castiel consigo. Acabei pulando por instinto.


* * *


Vou te falar, tem horas que pensei “Quer saber? Dane-se um maldito bracelete e uma droga de castiçal... vou continuar a beber e jogar conversa fora na ‘Taverna do Pala Chifrudo’...”. Então me lembro de que estamos dentro de um buraco, açoitado por seres malvados que não gostam de gente bêbada – nem tão bêbada assim.
Não sei dizer quantos metros tinha a queda. Mas cai em algo “fofo”. E não, pelos deuses, não caí em cima da barda... ou de Kreev... Era algo que cheirava mal, podia ouvir o barulho de água corrente e respingos. Estávamos num fosso. Os esgotos desta montanha maldita! Quis verificar o que era que tinha contido a minha queda e percebi quando dei o braço dela a Kreev. Era um corpo, um corpo já em estado de decomposição. Acabei confundindo seu braço longo e fino com uma tocha, e sem querer arranquei-lhe de seu tronco fraco, dando-o ao draconato. A mão do “cara” ainda tinha um anel, como lembrou Kreev, que prontamente fez questão de ficar com a jóia. Eu não sei bem como ele funcionava, apenas sei que Kreev conseguia enxergar novamente graças ao pequeno item. Com a ajuda do guerreiro e sua visão de volta, retirei alguns pertences que me pareceram úteis do corpo do “cara”. Trajes mágicos e até mesmo seu cajado eu peguei para mim. Aahh... o cheiro daquela roupa já usada em contato com a água suja do esgoto não era problema, até era algo bom, comparado com o que já vesti em noites de outrora. Castiel me olhava com nojo, mesmo sem conseguir me ver, tenho certeza. Bleiner terminou de “rapar” o pobre corpo, mas sugeri que não pegasse muitas coisas ou suas chances com a barda poderiam diminuir. Funcionaria se ele conseguisse me ver, pelo menos.

Continuamos seguindo aos ombros de Kreev, que agora podia enxergar onde íamos, pelo menos, e deixamos o resto do “cara”, inclusive seu braço, para trás.
Mais alguns passos, e saímos do fluxo da água suja do esgoto. Um levantado de pedra à esquerda da torrente foi por onde caminhamos. E o que encontramos ali, não foi algo muito agradável...
Havia uma câmara, feita toda de pedra-sabão numa das duas saídas que a passagem levava. Lá dentro, conforme Kreev nos contou, um corpo pendia da parede. “Vamos dar uma olhada nele” Sugeriu Castiel...

* * *

Sabe quando você bota um pedaço de pão velho no fundo de um copo e espera a primeira mosca zunir, louca para pegar seu “prêmio” no fundo do pequeno recipiente de vidro, daí então você o enche com a cerveja mais barata enquanto vê o inseto se debatendo e afogando dentro do copo? Qual é? Você nunca fez isso numa taverna? Mas que espécie de aventureiro é você?! Só quer saber de sair matando os outros por ai?! Precisa ler mais de meus relatos, jovem herói... e ver que o bom da vida é ficar no relento...

Mas estou divagando, novamente...

O fato é que foi basicamente isso que aconteceu só que sem cerveja barata... E sem afogamentos...
Entramos na câmara na formação “siga o mestre” – apoiando-se nos ombros do camarada da frente – e começamos a reparar o corpo da pobre criatura que fedia como bicho morto, presa à parede. Um pouco mais de um minuto depois e ouvi uma risada tosca e grave. Virei para trás chamando o pessoal e só tive tempo de ouvir um “BLAM!!” – as grades pesadas da “câmara” foram fechadas por um maldito forjado que ainda teve tempo de certificar se a tranca estava boa o bastante, para só depois dar no pé... Estávamos presos. Numa cadeia, no esgoto. Um cadáver à parede, atrás de nós. Bom, pelo menos eu tinha um novo cajado...

Tá, sem essa de tentar animar isso aqui. A situação estava feia.

Passamos horas ali dentro. Pude ouvir todos os tipos de palavrões em idiomas que creio nunca ter ouvido antes. Não faltaram “lembretes” à barda também, em dracônicos, por parte de Kreev. Mas eu sei como ela se sente, só queria ajudar...
O draconato guerreiro fez tudo o que podia para tirar a Comitiva de lá. Tentou subir até o teto, apoiado por Bleiner, e verificar uma pequena fissura no alto da sala, sem sucesso; tentou derrubar as grades, primeiro com seu machado, depois com seus próprios punhos, mas foi contido pela barda; tentou usar o corpo como uma espécie de pé-de-cabra, sem sucesso; tentou urinar em suas roupas para torce-las nos grossos ferros da prisão, mas nessa, eu o adverti que isso não funcionaria – eu já havia tentado em ocasiões passadas...
Kreev se dedicava, talvez mais por si mesmo do que pelo grupo, não sei dizer. Mas estava claro que ele era o único quem pensava em algo, normal, analisando que ELE ERA O ÚNICO CARA QUE CONSEGUIA VER ONDE PISAVA!
Castiel deitara no chão, em posição fetal. Pareceu-me receosa. O máximo que eu podia fazer era levitar o cadeado, quando eu conseguia enxerga-lo de relance, percebendo que o mesmo estava muito bem preso às grades. Quis deitar no chão, como a barda, mas prefiro ver meu amigo monge fazendo isso... Você sabe o que quero dizer.

Mais alguns minutos ouvindo a lamuria daquela meio-elfa e os suspiros do monge, Kreev me chamou:
- Hei, Ébrio! Você quer sair daqui?! – Sua voz estava agitada, parecia um tanto quanto frenética.
- C-claro, cara... mas como?

Ele me deu um objeto de metal. Estava gelado quando toquei e aos poucos percebi que se tratava de um escudo. Um escudo com uma ponta muito bem afiada.
Ficou claro para mim, ele iria usar o escudo na trava. Achei o máximo, contei a Bleiner a nova idéia e logo estávamos os três usando o escudo para sairmos dali. Quer saber o que foi melhor? DEU CERTO!!

A tranca disparou um “Crack!” e Kreev puxou as grades com o máximo da força. Ainda checou ao redor na tentativa de prever algum forjado, mas não aconteceu. Estávamos livres daquela prisão. Sem perder tempo, tratamos de continuar o caminho.

* * *

A passos rápidos, a Comitiva Escarlate mantinha sua formação “siga o mestre” nos corredores escuros da mina. Eu caminhava torcendo para na pisar nos pés de alguém, já que pisar nos meus próprios pés era inevitável.
Pude ouvir uma voz metálica atrás de mim, mas não quis saber do que se tratava. Apenas perguntei para Bleiner se ele tinha ouvido também, do qual me respondeu um assustado “Sim”, apressando mais ainda o passo.
Novamente a voz falou, agora mais alto. Não sei que raio de língua esses caras falam, mas soa como a guarda da Cidade de Pinus falando dentro de latas.
A voz do forjado gritava agora. Mais vozes se uniram, eu já não sabia dizer se elas vinham de trás de mim ou dos meus lados. Kreev começou a correr, soltando as mãos de Bleiner e Castiel que apoiavam-se em seus ombros. Choquei contra Bleiner. O draconato já havia disparado. No meio das vozes, pude ouvir a barda correndo também, em silêncio. Dei uma batidinha no ombro de Bleiner (por Acmyr, diga-me que bati em seu ombro...) e pus-me a correr também, o monge me alcançou em menos de dois segundos.
As vozes cresciam, o eco que eles produziam era capaz de tremer meus ouvidos. “AAaaahh!” – Ouvi a voz do draconato, que começou a se distanciar depois disso. Pensei “Opa, ele achou uma saída”, mas então, percebi que minha esperança estava indo cada vez mais para Anoehin... 

- E-ele, caiu! – Dizia a barda, tateando o chão à frente dela. – Acho que há um buraco aqui. Sua voz era uma mistura de cansaço com desânimo.
- Calma, Castiel. Vamos dar um jeito. – Bleiner sussurrou, tentando comove-la.
- Aeee... – Disse ao monge, mas acho que ele não entendeu minha mensagem.

Nesse momento, percebi que as vozes dos forjados pararam. A caverna produzia apenas o eco de nossas próprias vozes e seus caminhos continuavam mais escuros que a pele de um drow.

Você sabe o que é um drow, certo jovem aventureiro?

É, para falar a verdade, eu nunca vi um também. Mas minha mãe dizia que eles costumavam viver em Tubniar há décadas atrás, seja lá o que tenha acontecido com eles.

Bom, onde estávamos? Oh, sim. A caverna mais escura que um drow.
Castiel tentava falar com Kreev, mas sem sucesso. Era impossível saber se ele nos ouvia ou até mesmo se ele já tinha dito algo para nós. Quis verificar o lugar, mas quando você perde seu guia é meio complicado. Éramos, agora, três cegos perdidos num labirinto. Que deprimente, não?
A barda finalmente conseguiu contato com Kreev. O guerreiro caiu numa espécie de armadilha com uma rampa íngreme que o impossibilitava de escapar dela. Havia corpos por lá, mas ele disse que ficaria bem. Droga, eu precisava fazer alguma coisa! Não vou esperar mais forjados chegaram.
Pulei o buraco com cuidado. A saliência não era tão grande, mas um vacilo e você faria companhia para um draconato que provavelmente arrancaria a sua cabeça e depois desmembraria o que restou de seu corpo para montar uma armadura de carne-humana para si.

É... eu não duvido disso.

Chamei Bleiner comigo, que prontamente já estava do meu lado. Íamos os dois caminhando de vagar pela passagem, à frente do buraco de Kreev, o terreno estava em aclive, mas subíamos sem dificuldades. De repente, choquei-me contra algo metálico. “Duum...” soou nossa batida. Pensei “Fudeu, estou de cara com um forjado de dois metros e meio e ele vai prontamente certificar se eu fui um bom bêbado esses meses todos...”. Entretanto, sem ver que ele reagia, comecei a analisar melhor aquele metal. Não era um forjado, mas sim uma porta! Uma porta para fugirmos daqueles seres! Forcei-a de dois os lados e jeitos possíveis, mas ela não abria. Bleiner percebeu que ela tinha uma alça no fundo da mesma. “Provavelmente é uma porta de levante, acho que conseguimos empurra-la para cima” ele disse, fazendo meus ânimos voltarem.
Ficamos alguns minutos ali. O monge ainda usou algumas de suas ferramentas para ladinagem mas não conseguíamos abrir a maldita porta. Castiel dizia a Kreev que nós havíamos achado um novo caminho, mas que não conseguíamos destrancar a porta. Pude ouvir a risada do draconato dali mesmo, caçoando de nossa cara.
Quando Bleiner começava a entregar os pontos, quis tentar uma última vez. E quer saber? Deu certo...

Segurei a porta com as duas mãos. Com o pé, joguei a alça da porta cima. Não sei como pensei naquilo, mas o fato é que destravei a porta e consegui sentir uma lufada de ar entrando pela passagem. Era uma saída. Podíamos ver as terras escuras daquele continente se aglomerando entre florestas cinzentas e lagos negros que reverberavam a luz da lua.

- Livres... – Finalmente disse a Bleiner, que não sabia se sorria ou se chorava. Estava de noite, mesmo assim, conseguíamos enxergar uns aos outros naqueles poucos metros na beirada da caverna. O rosto do meio-orc estava sujo, como suas roupas. Nem perguntei a ele como eu parecia, pois tenho certeza que não era de uma forma agradável.
A saída era uma enorme descida. Nem precisei perguntar a meu amigo se ele encarava descer, pois eu tinha certeza que sim. Ao fundo, a barda contava feliz nossa proeza a Kreev.
Então percebi as florestas chacoalhando. O chão estremecendo de leve ao som de pesadas patas. Foi então que nossos estímulos definitivamente disseram adeus para nossas vidas. Vimos um enorme tarrasque caminhando incontrolavelmente a caminho de Alendar. E quando eu digo enorme é isso mesmo. A criatura era imensa! Ele derrubava árvores que pareciam ter levado séculos para chegarem àquela altura sem nem mesmo perceber: a floresta batia abaixo de suas ancas, ainda.
Se você não sabe o que é um tarrasque (sorte sua!!) aconselho a ir mais vezes na Biblioteca da Cidade do Sul.
Tarrasque

- Castiel... – Eu disse, tentando controlar minha voz. – Não diga nada disso a Kreev...
- Mas que coisa é aquela...
- Um tarrasque, meu amigo monge. Se é que eu posso chamar assim.
- Ele... ele parece ir descontroladamente para Alendar.
- Agradeça que ele não está vindo para cima de nós.
- Mas espere ai, em Alendar é onde estão os nossos itens! Junto daquele halfling maldito!

As palavras de Bleiner me fizerem tremer mais ainda. Quero dizer, se quiséssemos ter nossos equipamentos de volta, precisaríamos passar por aquilo.

- Comece a rezar para todos os deuses que você conhece, mulher... – Disse para Castiel que agora encontrava-se do nosso lado, admirada com a fúria daquele Colosso – Nós iremos precisar...

- Eldarion “Ébrio” Finruillas

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